o que não está lá
Sou uma leitora sôfrega. Tamanha é a urgência com que me faço aos textos que muitas vezes me acontece ler o que lá não está. Ora inverto sílabas, acrescento orações inteiras, substituo palavras. Vou na rua e qualquer palavra impressa me prende o olhar: suportes de publicidade, parangonas de jornais abandonados, toldos, paredes rabiscadas. A estranheza do resultado - a minha escrita alternativa é sempre estranha - alerta-me e sei que é mais um dos meus momentos em que vejo o que se projecta por entre as brechas de realidade. Mas essa é uma outra história.
Ler um texto apaixonadamente é insistir na vertigem e esperar que a queda seja a de Alice no país das maravilhas. Mesmo correndo o risco de perder a cabeça.
Claro que são raros os livros que me precipitam, assim como são raríssimos os autores que vivem lá em casa. Como disse Georges Steiner, ler é "estarmos prontos a receber em nossa casa um convidado", mesmo sendo possível que venha para destruir ou incendiar, que nos roube e deixe vazios. Se alguns são visitas, outros ganham o estatuto de hóspedes, velhos amigos que entram e saem a seu bel-prazer.
Isto para dizer que li, num livro de Cortázar onde se agrupam vários contos, uma história fantástica que só ele podia ter imaginado e escrito. Sei-lhe o título, o enredo e o desfecho. Sei que a li na língua original, acho até que consigo visualizar a mancha de texto. Só que não está lá. Nem no livro, exemplar físico que guardo em casa, nem, suspeito, em nenhuma das muitas edições de Bestiário que existam por esse mundo fora. E só me apercebi disso quando, meses depois da primeira leitura, quis lá voltar. E era tão claro, tão inequívoco, que ali devia estar que insisti, folheei, reli o índice, voltei atrás. Nada. Ainda hoje me acontece ficar sentada no sofá, olhar o livro na estante e acreditar. Acreditar que um dia vou ser capaz de reconstruir o percurso, abrir o livro no sítio certo e reler um dos melhores contos que Cortázar escreveu.
Ler um texto apaixonadamente é insistir na vertigem e esperar que a queda seja a de Alice no país das maravilhas. Mesmo correndo o risco de perder a cabeça.
Claro que são raros os livros que me precipitam, assim como são raríssimos os autores que vivem lá em casa. Como disse Georges Steiner, ler é "estarmos prontos a receber em nossa casa um convidado", mesmo sendo possível que venha para destruir ou incendiar, que nos roube e deixe vazios. Se alguns são visitas, outros ganham o estatuto de hóspedes, velhos amigos que entram e saem a seu bel-prazer.
Isto para dizer que li, num livro de Cortázar onde se agrupam vários contos, uma história fantástica que só ele podia ter imaginado e escrito. Sei-lhe o título, o enredo e o desfecho. Sei que a li na língua original, acho até que consigo visualizar a mancha de texto. Só que não está lá. Nem no livro, exemplar físico que guardo em casa, nem, suspeito, em nenhuma das muitas edições de Bestiário que existam por esse mundo fora. E só me apercebi disso quando, meses depois da primeira leitura, quis lá voltar. E era tão claro, tão inequívoco, que ali devia estar que insisti, folheei, reli o índice, voltei atrás. Nada. Ainda hoje me acontece ficar sentada no sofá, olhar o livro na estante e acreditar. Acreditar que um dia vou ser capaz de reconstruir o percurso, abrir o livro no sítio certo e reler um dos melhores contos que Cortázar escreveu.
3 Comments:
Fantástico!!
Sei o que é isso é! Por isso é que tento não voltar aos livros de que gostei, embora sejam os únicos que guarde.
Podes-me dar umas pistas do enredo? Gostava de aferir a sua existência ou não aqui por estes lados de Lisboa.
Grande post!
Qual é o conto?
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